artigo_atO processo sucessório é um dos ciclos mais complexos de uma empresa familiar. Ele envolve a escolha de um sucessor, a conquista do seu espaço, o desapego do sucedido, as relações de afeto e as comparações inevitáveis entre eles. É comum este processo gerar muita dor nas partes envolvidas.

No que tange ao fundador da empresa, começa com a árdua tarefa de escolher o seu sucessor, que muitas vezes é um filho ou um membro próximo da família. Portanto, espera-se que tudo transcorra bem, dada a relação de proximidade. O que ocorre, entretanto, é que o sucedido, ao deixar a posição que atuava por muito tempo, sente uma estranheza ao se deparar com a situação de não ser considerado nas decisões que antes eram assumidas por ele.

O sucessor, por sua vez, quer se apropriar da posição e fazer valer a sua autonomia para realizar novos projetos à sua maneira, implantando o seu estilo de gestão. Desta forma, acaba por não recorrer às opiniões do seu antecessor.

O sofrimento surge quando o sucedido espera que o sucessor demande orientações dele e que, ainda, ao implementar novas ações, não as realize desqualificando a gestão anterior. Ele espera, inconscientemente, que o sucessor destaque que os avanços ocorreram graças a um bom trabalho realizado previamente. Como isso nem sempre ocorre, a relação fica estremecida, gerando um clima de “disputa” entre sucessor e sucedido.

É possível compreender, entretanto, o movimento de “separação” do sucessor, já que este está em busca da conquista do seu próprio espaço de liderança. Este espaço é muito difícil de ser alcançado quando o sucedido ainda está na organização, seja em uma posição no conselho ou quando é admirado e mantido como referência para os colaboradores. Suas colocações continuam a ter um grande peso e o sucessor, apesar do esforço para realizar o seu trabalho e imprimir o seu estilo, vê suas iniciativas desaprovadas ou desestimuladas por todos.

Quando o diálogo não circula neste período, o silêncio pode ser visto como um desejo de rompimento, gerando insatisfação, rivalidade e fragilidade das relações e dos negócios familiares. É preciso lidar com estas questões do processo sucessório e trabalhar em conjunto para pensar em alternativas onde a disputa não fique mais forte do que o propósito que os une.

O conflito faz parte da condição humana e, por isso, deve ser acolhido e tratado, nunca evitado. É importante estimular o diálogo e entender as causas dos conflitos para que a situação não se agrave. Diagnosticar e tratar a situação crítica, compartilhando as insatisfações, pensando em conjunto nas possíveis soluções, restabelecendo a harmonia e a coesão. As famílias que dialogam sobre os seus problemas superam mais facilmente as desavenças do que aquelas que se esquivam do assunto.

É possível desenvolver uma gestão compartilhada, onde sucessor e sucedido valorizam os seus espaços e avanços. Há respeito, aposta nas competências complementares e nos olhares divergentes, que se fortalecem e fazem a organização avançar. Estes acontecem quando o processo sucessório é feito com muito diálogo e com a participação do sucessor e sucedido, preferencialmente no final da gestão de um e no início da do outro. Construir relações familiares de confiança, que respeitam as diferenças e acolhem opiniões divergentes refletirá diretamente na continuidade dos negócios.
*Artigo de Danielle Quintanilha – psicanalista, especialista em sucessão de empresas familiares e autora do livro “Famílias Empresárias… Vamos dialogar?” – publicado no jornal A Tribuna do dia 19 de dezembro de 2016

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